Agência e compartimentalização
-Não vou mentir dizendo que eu sei muito sobre as coisas que eu escrevo aqui, pq tirando alguns leves assuntos de computação, lol e smash eu não faço a menor ideia do que eu to falando.
Agência: um conceito mágico
Faz um tempo que eu tenho pensado em escrever sobre "agency", mas nunca sei exatamente sobre o que escrever ou sobre como explicar o conceito. A definição é a sensação de ter controle das suas ações e das consequências delas. Note que a definição traz como ponto a sensação de ter controle. É muito daquele esquema de "não sabendo que era impossível, foi lá e fez". E nem é exatamente sobre algo ser impossível, mas é aquelas coisas que nós levamos como normal que já deixamos enraizados em nós mesmos. São coisas invisíveis. É importante notar também que agência se trata de ter controle sobre as consequências, então não é só uma questão de fazer algo é questão de saber que aquela ação terá impacto no ambiente/situação em que você se encontra.
Eu acho esse exemplo maravilhoso. Ao invés de olhar o tempo, ser "restringido" pelas opções do tempo, eles foram lá e curtiram. Não existiu uma construção de que aquilo não poderia ser feito. Esse exemplo ficou ainda mais real qndo um amigoredacted que recentemente mudou pra amsterdã com um filho pequeno viu isso acontecendo na prática. Ele disse que como lá chove muito, é normal as crianças brincarem no parquinho mesmo que chova, se estava programado para brincarem no parquinho, eles vão brincar.
Esses dias eu estava na casa de uns amigosredacted e do nada a minha amiga começou a lavar a roupa de noite no meio de um dia de semana, algo que, querendo ou não, não se passava mais na minha cabeça (tudo bem que aqui existem algumas restrições de inverno/verão pra poder secar sem ficar cheiro e tals, mas não vamos nos ater a isso). Ela só foi lá e fez. Eu (antes de vivenciar esse acontecimento) olharia e falaria puts tem que esperar o final de semana chegar pra poder estender enquanto tá de dia.
Esses são exemplos pequenos, mas acho que existem muitas mais situações em que a gente não contempla a possibilidade de se fazer algo, porque existe a limitação X ou a limitação Y. Só vou escrever quando tiver tudo pronto, quando eu tiver todas as referências, quando tiver lido aquele artigo.
O legal também é ver pessoas com um bom nível de agência na vida. Você vê elas entrando em lugares e os transformando. Uma pessoa sozinha consegue transformar uma sala, consegue transformar todo um ambiente.
Ultimamente eu tenho a impressão que a gente se prende muito as rotinas. As paredes invisíveis falando que não dá. Muitas das vezes eu tbm acho que isso vem de uma certa compartimentalização.
Qual é a hora de se...
Qual a hora certa de se brincar no parquinho? A hora sem chuva.
Qual a hora de se aprender? Durante as aulas da faculdade.
Qual a hora de se divertir? Depois do expediente às 19hrs.
Uma professora de teatro estava compartilhando uma experiência que ela teve durante o mestrado dela. A proposta era apresentar o teatro para uma aldeia indígena no Amazonas, ela conta que foi um fiasco - eles chegaram lá com uma proposta pronta, enviesada pela nossa visão de mundo: eles iam montar um palco, chamando toda a aldeia que ia assistir dos barcos a peça que eles trouxeram. As pessoas da aldeia não gostaram da atividade, elas não tinham o conceito do "teatro". Eles não entenderam porque eles tinham que parar o que estavam fazendo para ir assistir algo. Para eles contar histórias era algo do dia a dia, algo que eles faziam durante a limpa da pesca, durante o trançado das folhas, as linhas entre trabalho e entretenimento não era algo que havia sido traçado.
Se eu tivesse que chutar esse é um reflexo de tentar maximizar os ganhos, é evidente que se durante um trabalho o foco for apenas no trabalho, ele vai ser mais "eficiente". Mas é mesmo? Ou seria essa uma outra regra invisível que nós aceitamos ao longo da vida?
Para qualquer pessoa que não trabalhou na Qulture, eu tenho a impressão que sempre que eu menciono ela, deve ficar até chato, mas é porque ela realmente mudou a maneira como eu vejo o trabalho. Foi muito um lugar em que eu fiz muito mais do que trabalhar, eu mesclei diferentes áreas da minha vida, não teve uma distinção de "hora de trabalhar" ou "hora de se divertir" ou "hora de aprender". Isso pra mim fica evidente quando eu percebo que falo com muita gente da Qulture ainda. Que essas pessoas genuinamente viraram meus amigos e que a gente mantém contato mesmo fazendo anos que eles já sairam de lá. Quando um desses amigos falou que já faz muito mais tempo que ele saiu de lá comparado ao tempo que ele ficou lá eu fiquei de cara. É comum o relato de pessoas que foram para outros trabalhos, fizeram bons colegas, mas nunca amigos como na Qulture. Existiu um gosto de aventura e descoberta que parece difícil de se experimentar em outros lugares. E não é que outros lugares não sejam bons, às vezes até são, mas existe essa compartimentalização uma barreira que parece que deixa tudo distante. O trabalho é o trabalho e a vida é a vida.
Mas chega de falar sobre a Qulture, voltemos ao tópico de compartimentalização (e classificação) com outro exemplo de "civilizações afastadas em que as coisas são feitas de maneiras diferentes":
Quando eu li esse texto pela primeira vez fiquei 🤯. Eu fico olhando e fico pensando: quais são as áreas que eu tenho agência para mudar? Trabalhar? É muito provável que independente do que eu faça eu vou ter que trabalhar de alguma maneira, essa não parece ser uma área que eu tenho agência (infelizmente). Ok... Mudar pra floresta? Não... não é nem algo que eu tenho vontade kkkk. Mas o que me deixa com uma pulga atrás da orelha é: num mundo com uma compartimentalização menor, talvez ir trabalhar é ir para um lugar que eu ligo para as pessoas que estão lá. Eu tenho a agência necessária para criar um ambiente assim? Se isso não depende só de mim, como eu faço para garantir que as minhas ações vão ter o resultado que eu espero que elas tenham? Quais são as coisas que de fato impedem que eu tente? Elas existem ou são apenas limitações invisíveis?
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